Distrito Federal precisa acabar com guerra fiscal

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Para o secretário de Fazenda, Adonias Santiago, o Distrito Federal é um dos maiores prejudicados com a chamada guerra fiscal, quando outras unidades da Federação oferecem sedutoras isenções de impostos que atraem empreendimentos antes sediado na capital. Adonias considera que a medida é urgente para a economia do DF. “Os  estados concedem incentivos e mandam as mercadorias para cá, com crédito fiscal de 12%, mas quanto efetivamente ele pagou? Em alguns casos, não chega a 1%, para vender mais. A empresa do DF que vende com um tributo real de 12%, não tem como competir com quem pagou 1% em outra unidade”, criticou.

Como se conseguiu aumentar em 5,5% a arrecadação do DF ano passado? Quais são as perspectivas para 2014?

A questão é que em 2013 tivemos uma atuação do fisco extremamente voltada para a recuperação de créditos vencidos e que não foram pagos nas épocas adequadas. Fizemos dois programas, um dando incentivos para pagamentos e conseguimos que uma parte fosse recuperada efetivamente. Arrecadamos mais de R$ 400 milhões. A segunda parte foi o reaparelhamento da Secretaria de Fazenda. Começamos a investir no ano passado muito forte em tecnologia de informação, obtendo dados para subsidiar o fisco. Por exemplo, hoje é possível saber quando uma determinada carga sai de São Paulo ou de qualquer outro local do Brasil em direção ao Distrito Federal. Temos as informações sobre quem é o remetente, o destinatário, o conteúdo e inclusive a placa do caminhão. Isso ajuda bastante a fazer o que chamamos de justiça fiscal, porque, se uns pagam e outros não, surge uma diferença na competição muito forte.

Diante do atual cenário econômico, o desempenho pode ser repetido esse ano?

O cenário não aponta para grandes movimentações financeiras, mas a ideia da Secretaria de Fazenda é agir na direção de evitar a sonegação fiscal. A eficiência fiscal é que vai trabalhar para compensar o crescimento, um pouco menor, da economia.

O consumo aqui no Distrito Federal está preocupando?

Não. O consumo está seguindo uma tendência nacional. O DF tem uma característica extremamente diferente das outras unidades da federação. Aqui, cerca de 80% da economia tributável é do consumo. A produção aqui é bastante menor do que nos estados. Com o controle  de ingresso e saída de mercadorias nós temos plenas condições de acompanhar esse consumo, que pode contribuir para a manutenção dos níveis de arrecadação. Também é positivo que o Governo Federal esteja aqui: em torno de 60% da economia do DF se vincula aos salários pagos pelo Governo Federal e pelo DF. E como essa fonte de renda é estável, não se esperam grandes oscilações no consumo. Ainda teremos algo em torno de 5 a 6% dos reajustes em média, que devem equilibrar esse processo.

Foi a inadimplência que provocou uma queda no Nota Legal  neste último ano?

No ano passado, colocamos à disposição cerca de R$ 205 milhões para a sociedade indicar créditos para o Nota Legal. Nesse ano, nós indicamos R$ 213 milhões. Entretanto o valor recolhido pela sociedade acabou sendo menor do que o do ano passado. No ano passado tivemos R$ 92 milhões de apropriação. O que ocorre é que nós tivemos cerca de R$ 180 milhões e mais de 200 mil contribuintes que deixaram de quitar os seus tributos e, consequentemente, quem não quita os tributos não tem condições de participar do Nota Legal. O que é uma pena.

Muita gente reclama que houve uma diminuição no valor dos créditos recebidos. O que explica essa diminuição?

São duas coisas. O crescimento da arrecadação é sempre menor do que a quantidade de participação. O crescimento dos valores destinados cresceu pouco, passou de R$ 205 milhões para R$ 213 milhões. Mas nós tivemos um crescimento de cerca de 25% da quantidade de pessoas que participaram. Quando se pide o bolo com uma quantidade maior de pessoas, é natural que a fatia de cada um seja menor. Outra questão é que uma grande quantidade de contribuintes acumulou durante dois anos os seus créditos e os usou em 2013. Chegando a 2014, é claro que o valor não é o mesmo do crédito acumulado.

 

O senhor percebe um desânimo da população em relação ao programa?

Na verdade, o que nós esperamos é que essa atividade de exigência da nota fiscal passe a ser um ato de cidadania. O tributo que uma pessoa paga já está embutido no preço da mercadoria que ela compra. Quando ela deixa de pedir a nota fiscal está deixando de fazer uma das obrigações do cidadão, que é fazer com que esse recurso transite pela empresa, chegue ao governo e retorne à sociedade sob a forma de benefícios. Talvez esse seja o nosso maior desafio. E eu acredito que isso vai acontecer.

Existe algum tipo de estimativa para a sonegação fiscal?

Já foram feitos alguns ensaios sobre isso. Não são seguros — exatamente porque a sonegação ocorre fora do processo de controle. Entretanto já se falou em 40%, que parece descrever de forma razoável o que ocorre nos últimos 30 anos. É claro que ela vem se reduzindo um pouco. Mas existem duas coisas que é preciso separar: a inadimplência, quando o valor do tributo é apurado, mas não recolhido. É diferente da sonegação propriamente dita, que são operações à margem da lei. Esses dois elementos devem andar na faixa de 40%. O que é inadimplência acaba indo para a dívida ativa, que está por volta de R$ 12 bilhões, um valor elevado. A recuperação histórica da dívida ativa fica por volta de 2%, mas neste ano conseguimos dobrar esse índice, com os programas que nós levantamos. È  algo que não pode parar. Nós estamos já na fase final de um projeto chamado cobrança fiscal fazendária no DF, que deve ser implantado nos próximos dois meses. Uma ação voltada para o que nós chamamos de recuperação de créditos fiscais e fiscalização intensiva, porque precisamos garantir os recursos para o Tesouro e a sociedade e o que nós precisamos garantir a isonomia de competição. Se não tivermos uma política séria de repressão à sonegação, as empresas que hoje trabalham corretamente, recolhendo impostos, e devem ser reconhecidas por isso, perderão competitividade, que é essencial para que o sistema se mantenha funcionando. O que esfacela uma sociedade é a falta de tributos. Se isso acontecer, existe uma tendência de piora nos serviços como educação, saúde e segurança.

O governo federal anunciou um contingenciamento de R$ 44 bilhões. Embora as verbas federais tenham destinação, o senhor teme corte nos recursos para investimentos?

Os cortes que estão sendo feitos são, principalmente, para custeio. Temos uma fonte, o Fundo Constitucional do DF, que é preservado. Com relação aos projetos estruturantes do Governo Federal,  vão continuar também porque são  necessários para garantir o desenvolvimento nacional. A questão básica é o que nós chamamos de aperto no custeio e nas atividades internas. Com certeza, o DF não enfrentará esse receio.

Os reajustes na segurança pública terão um impacto muito grande na distribuição dos recursos do Distrito Federal?

O governador Agnelo vem trabalhando com muito zelo nessa questão de remuneração de pessoal. Para todas essas categorias, vem trabalhando dentro dos limites prudenciais, de forma a obter correções e, ao mesmo tempo, garantir que a cidade continue funcionando. Nesse caso nós acreditamos que é possível fazer o que se chama de remanejamentos nesse processo.  O governo tem trabalhado com muito cuidado para ver onde é que ele pode renunciar sem prejudicar objetivos como educação, saúde, segurança, infraestrutura, conclusão de projetos que ficaram parados, o que foi comum durante a crise de 2010.

O GDF teme um efeito cascata para outras categorias?

O governador encaminhou 26 projetos de rearrumação salarial no ano passado. Com todos esses projetos encaminhados e dando seguimento para os anos de 2015 e 2016, a administração vai ser apenas de questões laterais. É claro que é necessário trabalhar com expectativas, mas é necessário administrar o dia a dia.

O DF está tratando melhor os seus contribuintes hoje, em relação ao atendimento ao público?

Está. Isso nós podemos dizer. Nós tínhamos unidades da EFazenda que estavam há até 12 anos paralisadas. Revertemos esse quadro No caso da unidade da Ceilândia, que chegou a se transformar em um centro de consumo de crack, hoje é um modelo de primeiro mundo. Para se ter uma ideia, nós já reformamos as agências de Taguatinga, Gama, Ceilândia, Brazlândia, Planaltina, e este mês fica pronta a agência de Sobradinho. Em março o centro de monitoramento fiscal. Vai ser um lugar onde vamos enxergar o movimento de cargas de todo o Brasil. Da nota fiscal eletrônica, emitida de qualquer parte do Brasil, nós teremos imediato conhecimento. Com relação ao contribuinte, fizemos outro investimento. Hoje 94% dos atendimentos podem ser feitos via web. Desenvolvemos programas que evitam que o contribuinte precise sair de casa para enfrentar fila na Fazenda.

Como o DF vê a questão da unificação do ICMS nos estados?

O ICMS corresponde a 50% da receita do DF. A reforma tributária é extremamente importante ao DF,  a unidade da Federação mais prejudicada em todo o Brasil na guerra fiscal. Ela é tão sinistra para ao DF, que nós apoiamos plenamente o Ministério da Fazenda na redação de uma medida provisória para isso. Cerca de 80% do ICMS do DF é de consumo. Os demais estados concedem incentivos e mandam as mercadorias para cá, com crédito fiscal de 12%, mas quanto efetivamente ele pagou? Em alguns casos, não chega a 1%, para vender para cá. O que acontece é que a empresa do DF que vende com um débito de 12% real não tem competitividade com quem pagou 1% em outro estado. O outro problema é que diante dos incentivos concedidos aqui, nosso Ministério Público tem ingressado com ações de inconstitucionalidade. Mas nos outros estados isso não acontece. O prejuízo não é só tributário, mas sim dos empregos, do fluxo econômico, nas cadeias produtivas. Nesse sentido, o governo aprovou o programa Ideias Industrial, em que o incentivo para as empresas se fixarem aqui deixa de ser tributário e passa a ser financiamento. Nesse caso, existe total segurança jurídica em quem vem investir no DF.

O Ministério Público de outros estados não é tão atuante como no DF?

A razão pode se dever ao financiamento do Ministério Público. É sempre feito pelo próprio estado, mas aqui é feito pela União. Existe uma visão diferente e nós não estamos dizendo que o Ministério Público local está agindo de forma inadequada, pois está cumprindo seu dever.  Mas se gerou uma insegurança jurídica e a quantidade de ações no Supremo Tribunal Federal é muito grande  Enquanto não são julgadas algumas delas, os incentivos se mantêm fora do DF. Isso é um problema que precisa ser resolvido.

É aceitável a carga fiscal brasileira, que supera 35% da renda? O senhor acredita que um dia será reduzida?

O percentual de 35% é pequeno, quando comparado a países desenvolvidos, onde chega a mais de 50%. Só que nesses países a maior incidência é sobre a renda e isso faz com que haja um maior equilíbrio em relação à tributação. Além disso, lá se prestam serviços de qualidade, e os recursos são devolvidos à sociedade. O ideal é que aconteça uma migração para maior justiça fiscal — que o tributo, em vez de feito sobre o consumo,  incida mais intensivamente sobre a renda. Para isso, é necessário elevar a renda. Nós temos o primeiro desafio que corresponde à educação e capacitação profissional. O segundo é uma melhoria no desempenho industrial, porque aí teríamos maiores possibilidades. O terceiro desafio é ter uma educação baseada na preparação das pessoas para o mercado de trabalho.

Fonte: Jornal de Brasília

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