O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) vai julgar hoje um assunto relevante para operações como Zelotes e Lava-Jato. Os ministros vão decidir se o Ministério Público e a Receita Federal podem compartilhar, para fins penais, dados bancários e fiscais de contribuintes sem autorização prévia do Judiciário.
Fontes que acompanham o tema afirmam que houve, nessas operações, uma intensa troca de informações entre o Ministério Público Federal (MPF) e a Receita. Em razão disso, ponderam, se o STF decidir que o compartilhamento dos dados depende de decisão judicial é provável que condenados ingressem no Judiciário com pedidos de anulação de provas.
O tema será julgado com repercussão geral. O caso (RE 1.055.941) envolve o Ministério Público Federal e dois investigados. O Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (Ibccrim) atua como amicus curiae.
A Receita Federal obtém dados acobertados pelo sigilo com base na Lei Complementar nº 105, de 2001, sem precisar de autorização judicial prévia. No processo, o Ministério Público Federal alega que não admitir que o Fisco, por meio de decisão fundamentada em procedimento administrativo fiscal, possa acessar informações financeiras e, havendo indícios da prática do crime, remetê-las ao órgão, seria instituir mais uma instância burocrática para o Estado.
Já os investigados afirmam que a Constituição Federal preserva o sigilo e seria necessária requisição judicial para o fornecimento de informações sobre clientes de bancos.
A Constituição e leis específicas garantem alguns tipos de sigilo, como de correspondência, bancário e das informações fiscais, segundo Davi Tangerino, advogado criminalista no Davi Tangerino e Salo de Carvalho Advogados. Isso não significa, contudo, que as informações nunca podem ser acessadas, mas que é necessário ordem judicial, de acordo com o advogado.
Para fazer o pedido judicial, o Ministério Público terá que fundamentar a requisição, diferentemente do que acontece hoje. “É uma proteção maior para o sigilo fiscal dos contribuintes, coloca um filtro a mais de controle para o poder do Estado”, afirma Tangerino.
Já para Giovanni Andrei Franzoni Gil, coordenador do Centro de Apoio Operacional da Ordem Tributária do Ministério Público de Santa Catarina, se for exigida decisão judicial, haverá “grandes prejuízos” à investigação penal de fraudes fiscais estruturadas, até porque haverá mais um caminho a ser transposto no processo.
De acordo com o coordenador, todo o sistema processual penal brasileiro caminha para que qualquer órgão público ao tomar conhecimento de um crime tenha a obrigação de comunicá-lo ao Ministério Público, remetendo ao órgão todos os documentos públicos obtidos. “Isso se dá sem quebra de sigilo, mas pelo mecanismo de compartilhamento de informações”, afirma.
A 1ª Turma do STF já se manifestou sobre o assunto. Decidiu, em dezembro de 2017, que não era necessária autorização judicial para repassar informações protegidas por sigilo bancário ao Ministério Público (RE 1.057.667). A turma seguiu o voto do relator, o ministro Luís Roberto Barroso. Ele entendeu que todos os órgãos envolvidos têm obrigação de sigilo em relação às informações. Por isso, não haveria a quebra de sigilo garantida pela Constituição Federal.
Por Beatriz Olivon e Joice Bacelo | De Brasília
Fonte: Valor