Especialista fala sobre os impactos do aumento na tributação ao varejo paulista, neste momento de crises sanitária e econômica, que afeta principalmente o micro e o pequeno empresário.
O início de mais um ano trouxe, naturalmente, boas perspectivas, em especial após um período tão difícil, incerto e adverso. No entanto, no ambiente empresarial, mesmo que haja otimismo diante a retomada das atividades, as primeiras notícias de 2021 ainda nos fazem crer em épocas tão (ou mais) desafiadoras quanto a que estamos vivendo até agora.
Cabe enfatizar que, apesar da recente autorização para o uso emergencial das vacinas no combate ao coronavírus, empresários de todo o País vêm cumprindo os protocolos de segurança recomendados pelos órgãos de saúde, para que, finalmente, consigam reabrir as portas de forma regular. Adaptações que impactaram ainda mais o orçamento, já excessivamente comprometido pelos efeitos da crise, dos quais o principal deles é o próprio encerramento das operações do comércio durante meses.
Cenário que, mesmo caótico e preocupante, não impediu o Governo do Estado de São Paulo em inserir medidas tributárias entre os assuntos prioritários. Em um momento no qual os gestores públicos deveriam estar atentos, exclusivamente, ao combate da pandemia – inclusive, priorizando ações protetivas na economia –, o que estamos assistindo é à criação de aumento da carga tributária, camuflada sob o traje de “Reforma Administrativa”.
O Projeto de Lei 529/20, mesmo revestido com o título supracitado, tem interesse estritamente arrecadatório, com a finalidade de cobrir o suposto déficit do orçamento público em razão dos altos investimentos realizados para coibir a proliferação da doença. Entretanto, com base no levantamento realizado pela FecomercioSP, apenas com a arrecadação de ICMS em novembro de 2020, houve um aumento de 12,5% em relação ao mesmo mês do ano anterior. Isso significa que o desempenho foi ainda superior no ano em que não havia pandemia, apenas com uma queda mínima de 2,5% na arrecadação acumulada do ano em comparação ao mesmo período de 2019.
Na contramão dos esforços de inúmeras entidades diante do Poder Legislativo para evitar ainda mais complicações neste momento tão severo para empresários e para a sociedade, a propositura foi convertida na Lei 17.293/2020. A lei, por meio do seu artigo 22, apesar das evidentes inconstitucionalidades por afronta a princípios da Constituição Federal (CF), acabou concedendo carta branca ao governador para renovação e redução de benefícios fiscais cujas alíquotas sejam inferiores a 18% no Estado paulista. Em linhas gerais, um aumento real de ICMS para o bolso dos contribuintes.
Mediante esta constatação, após a aprovação do referido ajuste fiscal paulista, o governo estadual editou quatro decretos (65.252, 65.253, 65.254 e 65.255), que revogaram benefícios fiscais de ICMS, acarretando o aumento da tributação, válido desde o dia 15 de janeiro de 2021.
Por outro lado, a lei em questão trouxe, nos artigos 41 até o 56, a possibilidade de a Procuradoria-Geral do Estado de São Paulo celebrar transação resolutiva de litígios de natureza tributária, envolvendo obrigação tributária ou não tributária, conforme definido pelo artigo 171 do Código Tributário Nacional (CTN).
Com isso, a transação tributária terá como objetivo a redução de litígios e será um estímulo à autorregularização e à conformidade fiscal, assegurando aos contribuintes em dificuldades financeiras novas chances para a retomada do cumprimento voluntário das obrigações tributárias. Após a aprovação da Lei Federal 13.988/2020, conhecida como “Lei do Contribuinte Legal”, que rege a transação tributária, tal iniciativa está sendo uma grande novidade para o contencioso tributário, tanto para os interesses do Fisco quanto para os contribuintes.
Em suma, é importante destacar a árdua e contínua batalha travada pelas entidades representativas, incluindo a FecomercioSP, que atuaram desde a tramitação do referido projeto de lei até os dias atuais – no constante diálogo com o Poder Executivo –, a fim de evitar todo e qualquer aumento na tributação neste momento de crises sanitária e econômica.
Em contrariedade às argumentações apresentadas, caso este seja, de fato, o caminho escolhido pelo Estado (aumento de impostos), o cenário se tornará devastador, com o fechamento de centenas de estabelecimentos e a eliminação de milhares de empregos.
A entrada de um novo ano, ao que parece, não significou, necessariamente, a chegada de novas perspectivas, mais promissoras. A não ser que o Poder Público tome consciência de que o empresário, sobretudo o micro e pequeno, não sairá “magicamente” de uma crise, trazendo consigo uma carga ainda maior, mais pesada e mais cara.
*Alberto Borges de Carvalho Junior é advogado, especializado em Direito Tributário pela FGV/SP; assessor Jurídico da FecomercioSP e assessor da Câmara Empresarial e Trabalhista de Arbitragem (Fecomercio Arbitral). Juiz do Conselho Municipal de Tributos (CMT) da Secretaria de Finanças do Município de São Paulo; Juiz (Suplente) do Tribunal de Impostos e Taxas (TIT) da Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo.