A Medida Provisória nº 627, publicada em novembro do ano passado, trouxe uma série de modificações nos campos contábil e tributário, com amplos reflexos no cotidiano das empresas. O principal foco da citada MP é a extinção do Regime de Tributação Transitório (RTT), que havia sido instituído pela Lei nº 11.941, de 2009, que buscava a neutralidade fiscal frente à adoção pela legislação brasileira dos padrões internacionais de contabilidade introduzidos pela Lei nº 11.638, de 2007 (IFRS).
As novas regras introduzidas pela MP passarão a produzir efeitos a partir de 1º de janeiro de 2015. Os contribuintes têm a opção de antecipar a aplicação das disposições para 1º de janeiro deste ano. Referida disposição está expressa no artigo 71 da MP e depende de regulamentação da Receita Federal sobre a forma, prazo e condições da opção.
Diante dessa possibilidade questiona-se: os contribuintes devem ou não efetivar essa opção após a regulamentação da Receita Federal?
Parece prematuro uma opção de antecipação de efeitos sobre algo que não se sabe como será em definitivo
A opção guarda total relação com os artigos 67 a 69 da MP, que dispõem sobre a não tributação dos dividendos e juros sobre capital próprio (JSCP) calculados com base nos resultados apurados entre janeiro de 2008 e dezembro de 2013 e pagos até a edição da MP em valores superiores aos apurados com observância aos critérios contábeis vigentes até 2007.
Contudo, o artigo 70 da MP estabelece que o disposto nos artigos acima mencionados (67 a 69) aplica-se somente às pessoas jurídicas que fizerem a antecipação dos efeitos para 2014 a que se refere o artigo 71. Vale lembrar que a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, por meio do Parecer PGFN/CAT nº 202/2013, e a própria Receita Federal por meio da Instrução Normativa nº 1.397/2013 já haviam manifestado entendimento de que os dividendos isentos e os juros sobre capital próprio seriam os calculados de acordo com as normas contábeis vigentes até 2007.
Assim, as empresas que, entre 2008 e 2013, distribuíram dividendos ou pagaram juros sobre capital próprio podem ter uma contingência fiscal, caso tais valores sejam superiores aos calculados de acordo com os critérios contábeis vigentes até 2007. Então, pode parecer em uma análise mais superficial que a adoção da antecipação dos efeitos seja recomendável, na medida em que afasta tais contingências fiscais, ainda que os contribuintes tenham argumentos a serem utilizados em sua defesa no caso de autuações futuras. Contudo, tal decisão deve ser melhor avaliada e também levar em consideração outros elementos que não somente as disposições dos artigos 67 a 69 da MP.
Outro ponto de relevância é o de que a referida MP já conta com mais de 500 sugestões de emendas feitas pelos congressistas. Até a sua conversão em lei, muito ainda há de ser alterado ou regulamentado, nos parecendo prematuro uma opção de antecipação de efeitos sobre algo que não se sabe como será em definitivo. As mudanças da MP na apuração do imposto de renda, contribuição social e PIS/Cofins frente ao novo padrão contábil podem significar um aumento de tributação para as empresa, que no caso da opção para 2014, se questiona, inclusive, se deve ou não ser observado os períodos de anterioridade de 90 dias previstos constitucionalmente, na medida em que foi o contribuinte que exerceu essa faculdade, não sendo uma imposição do Fisco.
Ademais, as MP também trouxe alterações no tratamento fiscal do ágio (goodwill) pago em investimentos permanentes. Contudo, estabelece que permanecem aplicáveis as regras ora vigentes (artigos 7º e 8º da Lei 9.532/97) às operações de incorporação, fusão e cisão ocorridas até 31 de dezembro de 2015, cuja participação societária tenha sido adquirida até 31 de dezembro de 2014. Entretanto, a MP não esclarece se tal disposição também se aplica aos optantes pela antecipação dos efeitos para 2014.
Vale ressaltar que a opção pela antecipação dos efeitos para 2014 será irretratável aplicável a todo o ano-calendário. Assim, frente ao fato de ser provável a introdução de alterações no texto da MP quando ocorrer sua conversão em lei e que diversos dispositivos ainda necessitam de regulamentação, torna-se a situação pouco clara e carente de uma maior segurança jurídica.
Fonte: Valor Econômico